quarta-feira, 11 de dezembro de 2013

Um dia lá chegaremos...

                              Um dia, lá chegaremos...

     -Vai-se já embora? - perguntou o velho que também já se levantara. - É seguramente a minha conversa que o afasta. Lamento imenso.Tinha ainda muitas coisas para lhe dizer. O senhor é da Misericórdia ou da Junta de Freguesia, não é?
   
 -Não, já lhe disse duas vezes que sou da Segurança Social. - disse o técnico especializado, que já estava com uma dor de cabeça com o esforço que fizera para o escutar.
     Apesar desta confirmação, o velho recapitulou mais uma vez o que dissera.
     O técnico num movimento resoluto colocou a mão no casaco, sem chegar a decidir-se a enfiar no bolso. Uma forma de lhe demonstrar, que chegou a hora de se ir embora. O ar livre estava ali mesmo a dois passos e ansiava virar as costas.
     - O senhor compreendeu o fundo do problema - disse o velho rapidamente.
     - Sem dúvida que sim, mas o senhor recusa-se a tomar uma decisão respeitante às minhas propostas.


Entre as vantagens e os inconvenientes, existe uma diferença colossal. Eu não o quero pressionar, mas neste caso, também não se deve perder muito tempo. Voltarei em breve - disse o técnico e, subitamente resolvido, estendeu a mão ao velho, de seguida precipitou-se para a porta.
     -Deverá cumprir a sua palavra - disse o velho que não o acompanhara -, de outro modo esta visita não teria qualquer sentido.
     - Tenho muitos casos neste bairro, irá levar o seu tempo, mas tenho a certeza de que continuar à  espera do seu sobrinho, não será a melhor solução para si! - respondeu secamente o técnico, já com os raios de sol a ofuscar-lhe os olhos e ao mesmo tempo pensou que quase esquecera, estava um belo dia!

      O velho ainda de costas, baixou a guarda e num tom de completa resignação, lançou para o ar um último desabafo.
      - Um dia também lá chegarás...- e uma lágrima recorrente, correu-lhe pela face.
      - Peço desculpa, não percebi? - disse o técnico, mais uma vez aproximando-se da sombra e um pouco confuso.
      - Deixe lá... Boa tarde...com sua licença. - Bateu a porta e acto contínuo, sentou-se mais uma vez naquele sofá coçado. Levantou o olhar pesaroso,  admirou mais uma vez as "testemunhas" naquela parede, transformadas em fotografias de outras épocas. Parece que foi ontem, mas todos partiram. Todos, raios me partam!!