terça-feira, 30 de agosto de 2011

Senhor Professor.


"Não te coíbas de repetir o que já disseste, porque és pequeno e só assim talvez será possível que te ouçam.". Comecei por citar Vergílio Ferreira por variadíssimas razões, mas a primeira, porque faz agora 20 anos que eu li uma entrevista sua que deu à revista K , conduzida por Pedro Rolo Duarte (um ex-aluno seu do Liceu Camões), ainda hoje guardo esse exemplar comigo. Uma conversa que me ficou na memória e que de vez em quando a vou reler. Passados 5 anos da publicação desta entrevista, faleceu no seu apartamento rodeado de livros em Alvalade e o seu corpo foi enterrado em Melo, a sua terra natal aonde nascera em 1916. Descansa junto à sua Serra da Estrela. Sinceramente o primeiro contacto que eu tive com a sua vasta obra foi através do cinema, no filme adaptado do livro"Manhã Submersa" de Lauro António (1980). Película em que ele próprio protagoniza o papel de Reitor e aonde também contracena com Eunice Muños, Jacinto Ramos e Canto e Castro, entre outros. Quando se fala em grandes escritores portugueses, geralmente nunca ouvimos falar do seu nome, talvez porque tal como ele refere neste depoimento, sempre foi um mal amado. Antes do 25de Abril não era compreendido por o regime vigente mas os comunistas também nunca o consideraram como um dos seus. Após a Revolução continuou a não ser compreendido e só depois da queda do Muro de Berlim, ele provou que tinha razão em relação a esse "bunker", palavra que utilizava para caracterizar o comunismo, dado que lhe parecia "uma estrutura de cimento armado impenetrável. Mas a História lá se meteu numa fenda, como as plantas se metem por entre as pedras e fazem estalar os passeios. e o bunker estalou."

Este beirão de gema era um humanista puro, relatava nos seus livros um personagem sempre perante a solidão das suas ideias que são intrínsecas e muitas vezes intransmissíveis e o mundo lá fora era invariavelmente uma absurda estupidez. Quando damos por nós a reflectir um pouco mais sobre o mundo que hoje nos rodeia, quantas vezes não ficamos com essa mesma sensação. A ultima vez que isso me aconteceu, foi quando acabei de presenciar à queda inevitável de Kadhafi na Líbia, com a entrada dos rebeldes em Tripoli e com a ajuda fundamental da NATO. Mas depois vejo as Nações Unidas encolherem-se e ficarem impassíveis perante a chacina de cidadãos inocentes na Síria, ás mãos de um outro ditador!- Diferença fundamental nesta hipocrisia, uns têm petróleo os outros não. Vamos divulgar ao Mundo meias verdades e deixemos que mais Vergílios Ferreiras ponham a mão na ferida e divulguem com serena melancolia que estes dias não são de festa pá!

1 comentário:

Humberto Baião disse...

Vergílio Ferreira, mal amado e mal conhecido. Este sim devia ter sido o nosso Nobel, fiquei contente ao encontrar quem o reconheça. Nunca é demais divulgar um homem que, mais que romances, nos deixou toda uma filosofia. Obrigado.